A Teoria de Trotsky para a Revolução Mundial
A Revolução Permanente, publicada em 1930 por Leon Trotsky, é uma das obras centrais de sua teoria marxista. Neste livro, Trotsky desenvolve e defende sua famosa teoria da revolução permanente, que propõe uma visão radicalmente diferente da revolução socialista em relação às teses que estavam sendo implementadas na União Soviética sob Joseph Stalin. A obra se concentra em explicar como as revoluções, especialmente nos países economicamente atrasados, devem ser vistas como processos contínuos que não podem ser limitados a uma única nação ou a etapas específicas. Trotsky argumenta que o socialismo só pode triunfar plenamente se for estendido a uma escala global, com as revoluções em um país alimentando e impulsionando revoluções em outros.
Trotsky escreveu A Revolução Permanente enquanto estava no exílio, após ter sido expulso da União Soviética pelo regime stalinista. Nesse contexto, ele articula uma crítica poderosa ao que ele considerava o desvio da Revolução Russa sob Stalin, particularmente em relação à tese do “socialismo em um só país”, defendida pelo líder soviético. O livro é tanto uma defesa da Revolução de Outubro de 1917 quanto um chamado para a continuidade das lutas revolucionárias em escala global.
1. A Teoria da Revolução Permanente: Um Processo Internacional e Ininterrupto
O ponto central de A Revolução Permanente é a ideia de que as revoluções socialistas não podem ser vistas como eventos isolados, limitados a uma única nação ou fase histórica. Trotsky argumenta que a revolução deve ser entendida como um processo contínuo e internacional, que começa com a luta contra o regime capitalista, mas que não pode parar até que o socialismo seja implementado globalmente. Para ele, a Revolução Russa de 1917 foi apenas o início de um processo maior que deveria ter se estendido a outros países, particularmente à Europa ocidental industrializada.
Trotsky sustenta que, nos países atrasados economicamente, como a Rússia czarista, as tarefas da revolução democrática burguesa (como a reforma agrária e o estabelecimento de direitos democráticos) não poderiam ser separadas das tarefas da revolução socialista. Ele defende que, nas condições do século XX, os países menos desenvolvidos não podiam passar por uma fase “burguesa” de desenvolvimento antes de embarcar na revolução socialista. Em vez disso, a classe trabalhadora nesses países, aliada aos camponeses, deveria liderar a revolução tanto no plano democrático quanto no socialista, estabelecendo uma ditadura do proletariado desde o início.
Ao contrário da tese defendida pelos mencheviques e, posteriormente, por Stalin — que acreditavam que a Rússia deveria primeiro passar por uma fase de desenvolvimento capitalista antes de atingir o socialismo —, Trotsky argumenta que a revolução não pode ser interrompida ou limitada por fases. Ele via a revolução como uma continuidade ininterrupta, onde as conquistas democráticas deveriam ser imediatamente levadas adiante para transformar a sociedade de maneira socialista.
2. Crítica ao “Socialismo em um Só País”
Trotsky dedica uma parte importante de A Revolução Permanente a criticar a política de Stalin de “socialismo em um só país”, que postulava que a União Soviética poderia construir o socialismo de forma isolada, sem depender de revoluções bem-sucedidas em outros países. Para Stalin, o foco da União Soviética deveria ser no fortalecimento do socialismo dentro de suas fronteiras, deixando de lado a ideia de uma revolução internacional imediata.
Trotsky rejeita completamente essa tese, afirmando que ela representa uma distorção do marxismo e uma traição aos princípios da Revolução de Outubro. Ele argumenta que o socialismo não pode ser alcançado em um único país, especialmente em um país atrasado como a Rússia, que ainda dependia de relações econômicas capitalistas internacionais. Para Trotsky, a construção do socialismo requer a derrubada do capitalismo global e a cooperação entre revoluções socialistas em todo o mundo.
A tese do socialismo em um só país, segundo Trotsky, levaria inevitavelmente à burocratização e à degeneração do Estado socialista, como ele acreditava que estava acontecendo sob o regime de Stalin. A insistência de Stalin em construir o socialismo de forma isolada, ao invés de apoiar revoluções em outros países, era, para Trotsky, uma capitulação às forças conservadoras e uma rendição à lógica do nacionalismo burguês.
Trotsky argumenta que o destino da Revolução Russa estava intrinsecamente ligado ao sucesso das revoluções proletárias em países mais desenvolvidos da Europa, como a Alemanha. Sem essa extensão internacional, o Estado soviético se veria cada vez mais isolado e vulnerável às pressões externas e internas, o que poderia levar à restauração do capitalismo.
3. A Revolução Permanente nos Países Atrasados: O Papel da Classe Trabalhadora
Outro aspecto importante da teoria de Trotsky é seu enfoque na classe trabalhadora como a principal força revolucionária, mesmo nos países atrasados economicamente. Ele argumenta que, nos países coloniais ou semicoloniais, onde a burguesia nacional é fraca ou cúmplice do imperialismo estrangeiro, a classe trabalhadora é a única força capaz de liderar uma revolução democrática e socialista.
Trotsky defende que, nas condições do capitalismo global do século XX, as tarefas de uma revolução democrático-burguesa (como a reforma agrária e a independência nacional) não poderiam ser realizadas pela burguesia local, que geralmente estava comprometida com os interesses do imperialismo. Em vez disso, cabia ao proletariado, em aliança com os camponeses, liderar a luta por essas reformas, ao mesmo tempo em que avançava em direção ao socialismo.
Ao defender a aliança entre trabalhadores e camponeses, Trotsky também rejeita qualquer ideia de uma “etapa burguesa” da revolução. Para ele, a revolução não pode ser compartimentalizada em etapas separadas, mas deve ser um processo contínuo que, uma vez iniciado, não deve parar até que o socialismo seja completamente implementado. A revolução, portanto, é permanente no sentido de que nunca atinge uma “fase final”, mas deve continuar até que a sociedade sem classes seja estabelecida globalmente.
4. O Papel do Internacionalismo: O Futuro da Revolução Global
A ênfase de Trotsky no internacionalismo é um dos elementos centrais de A Revolução Permanente. Ele acredita que o socialismo é, por sua própria natureza, um sistema internacional, e que a revolução proletária só pode triunfar plenamente se se espalhar para os países capitalistas mais desenvolvidos. Ele argumenta que o capitalismo é um sistema global interligado, e que nenhuma revolução pode sobreviver isoladamente por muito tempo em um mundo capitalista.
Trotsky reflete sobre o fracasso das revoluções na Europa após 1917, particularmente na Alemanha, onde as tentativas de revolução socialista foram esmagadas. Ele vê esses fracassos como tragédias que contribuíram para o isolamento da Revolução Russa e facilitaram a ascensão de Stalin e da burocracia soviética. No entanto, ele mantém que a luta pela revolução internacional deve continuar, e que a única maneira de salvar o socialismo na União Soviética seria apoiar e fomentar revoluções em outros países.
Para Trotsky, o destino da Revolução Russa está diretamente ligado à revolução mundial. Ele acredita que, sem uma revolução global, as pressões externas do imperialismo capitalista e as pressões internas da burocratização levarão inevitavelmente à degeneração do Estado soviético, como ele via acontecer sob Stalin. A única maneira de evitar esse destino é através da luta por uma revolução internacional contínua, que derrubará o capitalismo em todo o mundo.
5. A Revolução Permanente e o Marxismo
Em A Revolução Permanente, Trotsky também se propõe a situar sua teoria dentro da tradição marxista. Ele argumenta que sua teoria é uma extensão lógica do pensamento de Marx e Engels, que sempre defenderam que o socialismo só poderia triunfar em uma escala internacional. Trotsky critica a interpretação stalinista do marxismo como uma distorção nacionalista que trai os princípios internacionais do socialismo.
Para Trotsky, o marxismo é, por natureza, internacionalista e revolucionário. Ele defende que, em um mundo capitalista interconectado, nenhuma revolução pode sobreviver isoladamente. A revolução deve ser permanente, no sentido de que deve continuar a se expandir para outros países, impulsionada pela luta de classes global. O socialismo, para Trotsky, não é apenas uma questão de política nacional, mas de emancipação mundial.
Ele também destaca a importância da liderança revolucionária e do partido marxista como elementos cruciais para o sucesso da revolução. Trotsky acredita que a Revolução de Outubro foi bem-sucedida porque os bolcheviques, sob a liderança de Lenin, compreendiam as dinâmicas da luta de classes e estavam preparados para agir no momento certo. Ele defende que essa experiência deve servir de lição para futuras revoluções em outros países.
Conclusão
A Revolução Permanente é uma obra fundamental para entender a visão de Leon Trotsky sobre a dinâmica das revoluções socialistas e sua crítica ao regime de Stalin. Trotsky oferece uma defesa apaixonada da Revolução de Outubro e uma crítica devastadora da política de “socialismo em um só país”. Ele argumenta que o socialismo só pode triunfar globalmente, e que a revolução deve ser vista como um processo contínuo, sem etapas rígidas ou limites nacionais.
Trotsky apresenta uma visão de que a classe trabalhadora, mesmo nos países atrasados, pode liderar a revolução socialista e que o internacionalismo é a chave para o sucesso do socialismo. A Revolução Permanente continua sendo uma obra de referência para os movimentos socialistas e revolucionários em todo o mundo.
Obras Relacionadas:
- História da Revolução Russa, de Leon Trotsky – Um relato detalhado da Revolução de 1917, com análises políticas profundas.
- O Estado e a Revolução, de Vladimir Lenin – Um clássico do marxismo sobre a natureza do Estado e o caminho para o socialismo.
- A Revolução Traída, de Leon Trotsky – Uma crítica à burocracia soviética sob Stalin e à degeneração do socialismo na URSS.
- Socialismo em Um Só País, de Joseph Stalin – Uma defesa da tese stalinista que Trotsky critica em A Revolução Permanente.
- A Dialética da Revolução Permanente, de Michael Löwy – Uma obra que revisita e atualiza a teoria de Trotsky para os movimentos revolucionários contemporâneos.